Uma lenda indígena, descrita por Alcides Gatto, da Universidade Federal de Santa Maria, indica como começou o uso da erva mate. A mais antiga aponta para a trajetória de uma tribo nômade de índios guarany. Um dia, um velho índio, cansado das andanças, recusou-se a seguir adiante, preferindo ficar na tapera. A mais jovem de suas filhas, apesar do coração partido, preferiu ficar com o pai, amparando-o até que a morte o levasse à paz do Yvi-Marai, a seguir adiante, com os moços de sua tribo.
Essa atitude de amor rendeu-lhe uma recompensa. Um dia um pajé desconhecido encontrou-os e perguntou à filha Jary o que é ela queria para ser feliz. A moça nada pediu, mas o velho pediu ‘renovadas forças para poder seguir adiante e levar Jary ao encontro da tribo’.
O pajé entregou-lhe uma planta muito verde, perfumada de bondade, e o ensinou que, plantando e colhendo as folhas, secando-as ao fogo e as triturando, devia colocá-las num porongo e acrescentar água quente ou fria. ‘Sorvendo essa infusão, terás nessa nova bebida uma nova companhia saudável mesmo nas horas tristonhas da mais cruel solidão’. O ancião se recuperou, ganhou forças e viajou até o reencontro de sua tribo.
Assim nasceu e cresceu a caá-mini, que dela resultou a bebida caá-y, que os brancos mais tarde chamaram de chimarrão. A origem do nome mate vem do povo espanhol, que preferiu usar a palavra ‘mati’ (cuia), da língua quíchua, para se ajustar melhor à modalidade grave do idioma. No entanto, logo foi substituída por uma palavra guarany –caiguá – nome composto por caá (erva), i (água) e guá(recipiente).
Curando as ‘borracheras’
A tradição do chimarrão é antiga e remete a tradição à história da colonização espanhola. Soldados espanhóis, que aportaram em Cuba e foram ao México ‘capturar’ os conhecimentos das civilizações Maia e Azteca, em 1536 chegaram à foz do Rio Paraguay. Impressionados com a fertilidade da terra às margens do rio, fundaram a primeira cidade da América Latina: Assunción del Paraguay.
Acostumados a grandes ‘borracheras’ – porres memoráveis que muitas vezes duravam a noite toda – os desbravadores, nômades por natureza, sofriam com a ressaca. Aos poucos, foram tomando o estranho chá de ervas utilizado pelos índios Guarany e notavam que no dia seguinte ficavam melhores. Realmente, o mate amargo é um bom ativante do fígado, auxiliando a curar o mal-estar causado pela bebida.
O porongo e a bomba do chimarrão eram retirados de floresta de taquaras, às margens do rio Paraguay. Por causa da tradição, os paraguaios tomam a bebida fria e em qualquer tipo de cuia. É o chamado tererê, que pode ser ingerido com gelo e limão ou com suco de laranja e limonada no lugar da água.
No Brasil, a erva é socada; na Argentina e no Uruguai, triturada. Nos países do Prata, ela é mais forte e amarga, sendo recomendada para quem sofre de problemas no fígado.Um prazer compartilhado
Uma roda de chimarrão é um momento de descontração, fazendo parte de um ritual indispensável para unir gerações. O mate pode ser tomado de três maneiras: solito(isoladamente), parceria (uma companheira ou companheiro) e em roda (em grupo).
O mate solito faz parte da cultura do homem que não precisa de estímulo maior para matear do que sua própria vontade. Pode-se dizer que é o verdadeiro mateador, ao contrário do mate de parceria, em que a pessoa espera por um ou dois companheiros. É na roda de mate, porém, que esta tradição conquistou seu apogeu, agrupando pessoas em torno de uma mesma ação: chimarraer.
Aos navegantes de primeira viagem, um aviso: nunca peça um mate, por mais vontade que tenha. Poderá sugeri-lo de forma sutil, esperando que lhe ofereçam. Há um respeito mítico nas rodas de mate.Matear com excelência
Ao adquirir uma cuia nova é preciso curtí-la por, no mínimo, três dias, ato que é conhecido como curar uma cuia. Deve-se enche-la de erva-mate pura ou misturada com cinza vegetal e água quente, mantendo o pirão sempre úmido, impregnando, assim, o gosto da erva em suas paredes. A cinza é utilizada para dar maior resistência ao porongo.
Passando o tempo, retira-se a erva-mate da cuia com uma colher para eliminar os restos de erva. Basta enxaguá-la com água quente e estará pronta para ser usada. O mate se cura cevando, ou seja, quanto mais vezes é tomado, melhores serão os mates.O ato de preparar o mate pode ser chamado de:
cevar o mate
fechar o mate
fazer o mate
enfrenar o mate
ou chimarrão
A palavra amargo também é usada em lugar de mate ou chimarrão. Convite para tomar mate:
vamos matear?
vamos gervear?
vamos chimarrear?
vamos verdear?
vamos amarguear?
vamos apertar um mate?
vamos tomar mate ou um mate?
vamos tomar um chimarrão?
que tal um mate?
A mão direita – A entrega da cuia e o recebimento do mate deve ser feito com a mão direita.
Enchendo o mate – Pega-se a cuia com a mão esquerda e o recipiente com a direita. Após, acomoda-se o recipiente e se troca a cuia de mão para matear ou oferecer o mate. seguindo-se, sempre, pelo lado direito, o lado de laçar. O sentido da volta na roda de mate deverá partir pela direita do cevador ou enchedor de mate.
A água para preparar o mate – A temperatura nunca deve estar muito quente, pois pode queimar a erva, dando um gosto desagradável ao mate e lavando-o rapidamente.
O pialador de mate – É o indivíduo que, chegando numa roda de mate, posiciona-se à frente da pessoa que está mateando e à esquerda na mão da roda. O correto é ficar antes do mateador, sempre a sua direita.
A água do mate – A água nuncadeverá ser fervida, pela perda de oxigênio, transmitindo um sabor diferente ao mateador. O ideal é quando a água apenas chia.
Cevar com cachaça – Quando as pessoas fecham um mate (ato de prepará-lo), costumam, em lugar de água para inchar a erva, colocar cachaça, pois ela fixa por mais tempo a fortidão da erva-mate, sem deixar o gosto do álcool. Uma vez inchada a erva, cospe-se fora a infusão até roncar bem a cuia, esgotando-se completamente o líquido.
Só o cevador pode mexer no mate – A menos que se obtenha licença, só o cevador deve arrumar o mate, considerando-se falta de respeito mexer sem permissão. Podemos, isto sim, ao devolver a cuia, avisá-lo do problema.
Em roda de mate – É comum, após o primeiro mate, que sempre é do iniciar a rodaa pelo mais velho ou por alguém a quem se queira homenagear.
O primeiro mate – Todo aquele que fecha um mate deve tomá-lo primeiro em presença do parceiro ou na roda de mate. Este fato se tornou tradicional devido a épocas em que o mate serviu de veículo para envenenamentos. Por isso, o ato do mateador tomar o primeiro indica que o mate está em condições de ser tomado. Há a lenda jesuíta, que atribuía valores afrodisíacos ao mate. Para evitar que os índios passassem a maior parte do dia mateando, tentando afastá-los do hábito, criaram o mito entre os silvícolas cristianizados que Anhangá Pitã (diabo) estava dentro do mate.
Roncar a cuia – Uma vez servido o mate, deve ser tomado todo, até esgotá-lo, fazendo roncar a cuia.
Os dez mandamentos do chimarrão
1) Não peças açúcar no mate
2) Não digas que o chimarrão é anti-higiênico
3) Não digas que o mate está quente demais
4) Não deixes um mate pela metade
5) Não te envergonhes do “ronco” no fim do mate
6) Não mexas na bomba
7) Não alteres a ordem em que o mate é servido
8) Não “durmas” com a cuia na mão
9) Não condenes o dono da casa por tomar o 1º mate
10) Não digas que chimarrão dá câncer na garganta
Mate para estribo – É o último mate para brindar um visitante pronto para partir
Como o mate do João Cardoso – Fato que nunca se realiza
Aquentar água para outro tomar mate –Preparar um negócio para outro colher os lucros
Andar de carijo aceso – Moça que anda ‘feito louca’ atrás de namorado
A vida é como o mate, cura cevando – É vivendo que se aprende
Fulano anda tomando mate com rapadura –Estar feliz, alegre
Andar com cara de mate fervido – Andar sem graça, triste
Primeiro os encargos, depois os amargos –Primeiro as obrigações, depois os mates.
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